Em todas as edições
o vestibular traz à nossa cidade um bando de jovens num colosso de ônibus de
várias procedências. Alguns (ônibus, não estudantes) tornaram-se fregueses de
nossas ruas e avenidas. A cada vestibular aparecem de novo. Sinto um prazer infantil
em admirá-los. Sua elegante beleza é um convite a viajar para lugares
desconhecidos. Lembram meu tempo de criança. Eu nem sonhava com outra forma de
viajar que não de ônibus. Naquele tempo eles eram diferentes. No interior em
que vivíamos, ônibus era uma gaiola comprida na qual se enfiavam quantos
infelizes coubessem. Às vezes, até mais do
que cabiam. Levados por centenas de quilômetros, o tempo parecia não ter fim.
Conforto, nenhum. Espremidos no meio de sacos de mantimentos, de pacotes, quando
não de frango ou de leitãozinho peado, os passageiros suavam como tampa de
chaleira. Mães com nenê sofriam o que não sonhavam haver de sofrimento. O ambiente
recendia a vestiário de futebol em tarde de dezembro. Só a necessidade fazia embarcar
em tal carroção motorizado.
Agora, tudo é diferente.
A vida mudou para melhor. Essa molecada que se diverte – com tablets, smartphones
e mais quantas novas bugigangas eletrônicas o comércio lança, todo mês – não dá
conta de calcular a moleza que é viajar nos dias de hoje. Mesmo de ônibus. Os
atuais são ultramodernos, espaçosos, dotados de tantos itens de conforto que
nem em casa conseguimos colocar. Conforme a ocasião, oferecem viagem mais
agradável ou rápida que as modernas aeronaves que cortam os ares.
Alguns ônibus destinados
ao vestibular de nossas universidades procedem do interior paulista. De cidades
como Birigui, Penápolis, Votorantim... Imagino-os locados por cursinhos da
região. De tê-los visto tantas vezes, já os tenho como amigos. Dois em especial
me cativam a atenção acima dos demais. Descobri-os no ano passado. Voltaram
para o vestibular desta semana. Sem receio de me enganar, garanto que são mais bonitos
e mais novos que todos os outros. Nas laterais, em grandes e graciosas letras
manuscritas, o nome da empresa, que é também o da cidade: Poloni Turismo. Ninguém
faz ideia do que isso quer dizer. Mas para mim é importante. Eles são da minha cidade.
Minha e de mais quatro maringaenses. Podem achar tolice, mas não sabem vocês o custo
que é explicar meu local de nascimento, toda vez que me pedem a informação. Explico
que se trata de uma pequena cidade da Araraquarense (5.500 habitantes), próxima
de São José do Rio Preto. Que o nome foi dado pelo fundador, Cândido Poloni, de
ascendência italiana, que, em 3 de maio de 1926, fundou uma vila no meio dos
cafezais da região. Para os céticos os ônibus estão aí provando que ela existe.
A maior parte
da infância, vivi no sítio. Morei só em duas cidades. Bem pequenas, e por pouquíssimo
tempo. Ambas levam o nome do seu criador. A outra é Jales, iniciada por um
engenheiro de nome Euphly Jales, em 1940. Conheci ambos os fundadores. Que,
evidentemente, nem se deram conta de minha insignificante existência. Mais de
meio século depois, divulgo as cidades que fundaram. Obscuros povoados, que me
ajudaram a ser o adulto que hoje sou.
Alguns renegam
sua origem modesta. Mas valor, se temos algum, nós o levamos dentro de nós. E
ele começou a ser construído na cidadezinha humilde, que jamais deixa de ser
nossa.
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