domingo, 14 de outubro de 2012

Um silêncio bendito - por padre Orivaldo Robles


Pobre se contenta com pouco. É bom, porque não fica correndo atrás de coisas impossíveis. À saída da igreja, me interrompe um casal e, emocionada, a senhora diz: “Obrigada pelo seu livro. Ele ajuda a educar os filhos”. Não imaginava. Fez-me bem saber que alguns aproveitam assim o que escrevo. Deus seja louvado. Dias depois, um amigo, que há tempo não via, admite: “Leio sempre sua crônica. Aquela sobre seu irmão foi especial. Mostrei a um amigo, que também apreciou. Você gostava desse irmão, hein”. Emoção é algo muito pessoal, mas não intransferível. Sempre podemos reparti-la com alguém. Semana passada, num intervalo do retiro espiritual, para minha surpresa, o pregador rompeu o silêncio para me dizer: “Dei uma folheada rápida no seu livro. Vi uma crônica aqui, outra ali. Depois lerei com tempo. Aquela sobre seu irmão me impressionou. Não pare de escrever”. Alguns amigos (para dizer a verdade, poucos) quiseram saber por que a crônica não foi publicada no sábado passado. Fiquei feliz que alguém tenha notado a falta. Expliquei que estávamos em retiro espiritual do clero, quatro dias de reflexão, oração e silêncio, que fazemos todos os anos. Saímos na segunda-feira; só retornamos na sexta, depois do almoço.
Não sei quantos leitores conhecem o Recanto Marista, em Doutor Camargo. É uma das realizações mais preciosas do querido irmão Pedrão. Erguido às margens do Rio Ivaí, é um belo refúgio para finais de semana de famílias que tentam escapar da algazarra da cidade. Ou para a paz de quem deseja um espaço de silêncio, cada vez mais raro na vida agitada dos nossos dias. Há anos ele nos vem beneficiando. Aproveitamo-lo com poucos, mas preciosos dias que consagramos ao recolhimento e à oração. Acredito que pela minha origem roceira, a cada votação para escolha do local de retiro do clero, todo ano voto no Recanto Marista. Que existe lá de tão bom? Ah, o verde do mato, o azul do céu, o canto dos pássaros, o guincho dos macacos, o suave marulho do rio. As instalações são modestamente confortáveis. O cardápio, preparado com carinho de mãe por bondosas senhoras que nos acompanham, faz anos. Num lugar assim o silêncio é uma bênção de quase tocar com a mão.
Em ano eleitoral então, longe do bombardeio da campanha política, quatro dias representaram um presente extra. Não é um bom motivo? Os mais jovens talvez não compreendam. Mas quem já cruzou a barreira dos setenta sabe do que estou falando. Somos de um tempo em que música era levada a sério. Só se metia a compor quem tinha competência. Até jingles de campanha política eram bem feitos. A gente podia não gostar do candidato, mas ouvia com gosto sua melodia. Hoje musiquinhas políticas são um horror. Claro atentado contra pobres ouvintes, que não têm como se defender. Tenho para mim que alguns candidatos acabaram derrotados por culpa da propaganda musical. Não basta plagiar melodia existente e trocar a letra. Às vezes a original já era um lixo. A “composição” política então se torna execrável. Difundida pelas ruas, à exaustão e em volume aterrador, só dá raiva, causa irritação. Quem vai votar num candidato desses? Quando alguém se candidata, por favor, cuide com grande antecedência de procurar bons músicos. Este ano, a propaganda musical de alguns candidatos a vereador, que pobreza! Um alívio quando terminou.

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