sábado, 16 de fevereiro de 2013

E agora, José? - por padre Orivaldo Robles


Em 19 de abril de 2005, uma terça-feira, segundo dia de votação, o cardeal chileno José Arturo Medina Esteves veio ao balcão da Basílica de São Pedro e proclamou: Habemus papam. O novo pontífice, chamado José, escolheu o nome de Bento. Era a escolha previsível, apesar de se tratar de um quase octogenário. Não se passaram oito anos. Neste 11 de fevereiro, segunda-feira de Carnaval, o papa de quase 86 anos apresentou sua renúncia. Com Drummond perguntamos: E agora, José?
Este idoso José é um professor universitário, autor de mais de 40 livros, unanimemente reconhecido como o maior teólogo vivo. Desde 1953 com brilhantismo ministrou suas aulas nas universidades de Bonn, Münster, Tübingen e Ratisbonna. O cardeal Josef Frings, arcebispo de Colônia, escolheu-o como assessor teológico para assisti-lo no Concílio Vaticano 2° (1962-65). Ao lado de Karl Rahner integrou um grupo de teólogos de vanguarda que assessoraram bispos da Alemanha, Áustria, França, Bélgica, Holanda e os notáveis arcebispos italianos Giacomo Lercaro, de Bolonha, e João Batista Montini, de Milão, este, eleito depois ao papado com o nome de Paulo 6°.
Seu trabalho renovador sofreu duro golpe com os rumos tomados por católicos de regiões da Europa no pós-concílio. Era o tempo da corrida armamentista, da revolução sexual, de Betty Friedan, do Bra-Burning, de Daniel Cohn-Bendit, da revolta estudantil no Quartier Latin, da Guerra do Vietnã, do Woodstock, das ditaduras cruéis na América Latina... A Igreja não ficaria imune a tudo isso. O teólogo de mente aberta sentiu necessário rever posições que entendia comprometer valores perenes da mensagem cristã. Quem não viveu essa fase histórica não compreenderá o drama íntimo de um intelectual comprometido, mais que tudo, com sua consciência.
Em 1977 Paulo 6° nomeou-o arcebispo de Munique-Freising e, logo depois, cardeal. João Paulo 2° confiou-lhe, em 1981, a Congregação para a Doutrina da Fé. Aceitou, conhecendo que ia se defrontar com “certo tipo de relativismo, que diz que tudo é apenas uma questão de opinião e preferência, e que a verdade não existe”. Sua postura firme lhe renderia o rótulo de conservador intransigente, que muitos lhe atribuem. Completados os 75 anos de idade, por duas vezes apresentou renúncia, conforme previsto no Direito Canônico. Não foi aceita por João Paulo a quem coube substituir em 2005.
Diferente de seu carismático antecessor, incomoda-o a exposição midiática. Multidões o assustam. Ele é um intelectual tímido, sempre saudoso da cátedra, dos livros e do silêncio das bibliotecas. Nos tempos do magistério, dividia seu salário com estudantes pobres do 3° Mundo, que recebiam bolsa para estudar na Europa. Apesar da provecta idade e reduzido vigor físico, nos oito anos do papado conseguiu disposição e tempo para escrever três encíclicas e publicar três livros.
No dia 11 passado, anunciou: “Depois de ter examinado repetidamente a minha consciência diante de Deus, cheguei à certeza de que as minhas forças, devido à idade avançada, já não são idôneas para exercer adequadamente o ministério de Pedro. [O vigor do corpo e do espírito] nos últimos meses, foi diminuindo de tal modo em mim que tenho de reconhecer a minha incapacidade para administrar bem o ministério que me foi confiado”. Marcou para 28 deste seu último dia no cargo e pediu “perdão por todos os meus defeitos”.
Num tempo em que pronunciamentos e fatos se divulgam mundo afora em tempo real, sobram interpretações para todos os gostos. Todos se dão ao direito de opinar, ainda que ignorem sobre o que falam. Este é o nosso mundo. Mas há que reconhecer: exige-se muita grandeza para saber a hora de deixar o comando.

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