sexta-feira, 14 de junho de 2013

Namorados - por padre Orivaldo Robles

Minha cidade, no interior paulista, ostenta na única praça uma estátua de Santo Antônio. Nenhuma novidade. Em Curitiba, na praça da Catedral, há uma estátua de Tiradentes. A da minha cidade foi doada por Durvalino Magrini e inaugurada, nos anos 50, perante um colosso de gente. Um frade franciscano português, convidado para o evento, em seu discurso, várias vezes, falou de Santo Antônio de Lisboa. Deixou-me confuso. O padroeiro do lugar era Santo Antônio de Pádua, único que até ali tinha ouvido. Só mais tarde vim saber que ele era natural de Lisboa. Morrera em Pádua, na Itália, daí a designação pela qual é conhecido. Mas experimente convencer um português a chamá-lo Santo Antônio de Pádua!
Trazida pelos colonizadores, sua devoção tornou-se, no Brasil, tão popular que mudou a data do Dia dos Namorados. Entre nós ninguém o celebra a 14 de fevereiro, dia de São Valentim, como fazem outros países. Dia dos Namorados aqui é 12 de junho, véspera de Santo Antônio. Por causa da sua fama de santo casamenteiro. Lendas variáveis apresentam-no como paladino do amor entre jovens que alimentam o desejo sincero de se casarem. Santo Antônio é o protetor dos namorados.
Se há no Brasil uma palavra que mudou inteiramente de sentido é namoro. O que ela quer dizer, hoje em dia, não recorda em nada o que significou há algum tempo. Pergunte a um jovem o que é “vela”. Ele se lembrará do cilindro de cera com um pavio que se acende para clarear; da peça do motor de combustão que produz fagulha; ainda da grande parte de uma embarcação tocada pelo vento. Conte-lhe que também pode significar pessoa em vigília, observador, sentinela. Ele achará estranho. Estranhará ainda mais se souber que os antigos usavam vela para cuidar do namoro dos filhos. Especialmente das filhas. Pais costumavam deixar o casal de namorados na sala. Mas não inteiramente sós. Escalavam uma criança – a vela – para fazer-lhes companhia. Conheciam a natureza humana. Para evitar possíveis dores de cabeça, levavam a sério a máxima, trazida pelos portugueses, suponho: “O homem é fogo; a mulher, estopa: quando se juntam vem o diabo e sopra”.
Como analisar pais que agiam assim? Eram antiquados? Ignorantes? Prefiro achar que fossem apenas de outra época. Viviam num mundo diferente. Faço uma comparação: Naquele tempo, a maior carroça não aguentava carga superior a 500 quilogramas. Cruzando hoje nossas estradas, uma carreta transporta 32 toneladas. Considerava-se estudado quem tinha concluído o curso primário. Agora, nem pós-doutorado assegura uma qualificação definitiva. O mundo em que vivemos está permanentemente aberto a mudanças e novas descobertas.
O passar dos anos trouxe alteração do sentido de muitas palavras. Não expressam mais a significância original com que foram criadas. Também transformou muitos costumes. Buscando uma tradução fiel, que se entende atualmente por “namorar”? Qual o exato significado que as pessoas dão a palavras como namoro e namorado(a)? E, por consequência, para que serve um Dia dos Namorados? Como celebrá-lo com toda a solenidade possível? Pela propaganda que bombardeia nossa mídia, muita gente não conseguirá pensar em nada diferente de um delicioso jantar a dois, seguido de uma ardente noite de sexo.

Depois há quem reclame que um casamento preparado desse jeito não vai muito longe. E podia?

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