Tarde de um domingo destes.
Caminho para a Catedral. Em minha direção, na calçada, vêm dois rapazes. A todo
instante olham para trás com um sorriso maroto. Lá adiante, o motivo: três
garotas em shortinhos sumários, que só não revelam pensamento. É a moda, que
fazer? Ninguém lhe resiste. (A propósito, alguns esperam que o padre condene
trajes curtos na igreja. Nunca me senti à vontade para isso. Não é minha praia.
Faz anos, após muita cobrança, expliquei: “Gente, não tenho nenhuma competência
para a moda. Nem, aliás, para muitas outras coisas. Não se usa longo em praia
nem biquíni em casamento. Para uma igreja, o marido, pai, avô, irmão, primo, namorado...
da senhora ou da senhorita vejam se a roupa é adequada ou não. Quem convive com
elas é que deve opinar sobre o que vestem”).
Voltando às jovens: alcanço-as no
semáforo fechado. Antes que ele abra por completo, passam correndo. Um
motorista buzina. A mais alta ergue o braço e, sem se importar com os presentes
– parece desejar que todos ouçam – grita, o mais forte que pode: “Ah, vá se
f...”! Levo um susto. Sou antiquado, reconheço. Entendo palavrão como descortesia,
falta de educação. Pelo menos em público. Vindo de mulher, então, é um
descalabro. Nos marmanjos, mais desbocados por natureza, surpreende menos. Mas
mulher é pessoa fina, nobre, gentil.
Sabe-se lá quem criou o xingamento
ou o baixo calão, que todas as línguas conhecem. Aquele mais comum, que ofende
a mãe do atingido, pelo jeito, existe há séculos. Quase todos os povos o
utilizam. Ou todos mesmo. Até na Bíblia, onde ninguém esperava encontrá-lo, ele
aparece. Saul, primeiro rei de Israel, era um indivíduo de maus bofes. Apesar
da nobreza do cargo, não tinha muita preocupação com a fineza das palavras. Prática
seguida, ainda hoje, por muitos ocupantes de altos postos que, longe dos
microfones, mostram levar uma latrina na boca. Num rompante de ira contra o
filho Jônatas, Saul sapecou-lhe o xingamento de uso universal (1Sam 20,30). Para
não chocar o leitor, as traduções da Bíblia costumam usar expressão mais suave.
Mas, no popular mesmo, a gente sabe muito bem o que ele disse. E olhe que Saul
viveu no século 11 a. C., embora os livros de Samuel, que contam a sua saga,
tenham sido redigidos pelo século 7° a. C. Como se vê, boca suja não é invenção
de hoje.
Não sou nenhum puritano; não me
escandaliza qualquer besteirinha. Compreendo, além disso, que situações
excepcionais, vez por outra, acabem com a paciência do mais devotado discípulo de
Jó. Por experiência aprendi, ao longo dos anos, quanto nos pesa o barro de que somos
feitos. Mas uma dose de cuidado com as palavras cairia bem entre nós. Ultimamente
as pessoas vêm usando um palavreado de fazer corar marinheiro em cais de porto.
Isso é ser moderno, ser livre? Não será, antes, grosseria, falta de educação?
Desculpem-me os que me consideram
um velho quadrado. Mas reflitam comigo: com razão reclama-se da violência que
hoje assola o nosso mundo. Entretanto a violência nutre-se também da agressividade
expressa no modo de falar. Do prazer doentio desfrutado por muitos num
vocabulário canalha que, longe de dignificar, avilta as pessoas. Não será o
caso de cuidarmos um pouco mais das palavras que usamos?
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