sábado, 4 de agosto de 2012

Campanha política - por padre Orivaldo Robles


De campanha política a mais antiga lembrança que guardo vem de uma fase longínqua, na infância, dos meus quatro ou cinco anos. Morávamos ao lado do terreirão, junto da tulha. A propriedade recebia o imponente nome de fazenda. Não pela extensão, mas por admitir várias famílias na lavoura de café. Era costume chamar sítio à propriedade tocada pelo dono, que nela residia e, eventualmente, empregava um ajudante com ou sem família. Morávamos na fazenda em que o café, plantado no sistema antigo, não condensado, dificilmente chegava aos cinquenta mil pés. Separada de nossa casa pelo pasto estendia-se a colônia. Pequena. Ocupada não por colonos, como o nome sugere. Pelo menos no sentido antigo da palavra. Os moradores das cinco casas construídas em série eram ditos meeiros. Embora, com exatidão maior, devessem chamar-se porcenteiros. Pois trabalhavam pelo ganho de 35, 40 ou 45 por cento da colheita anual do café. O pai era o fiscal. Supervisionava a fazenda e respondia por tudo. Era assalariado. À frente da nossa casa corria uma estradinha. Cruzava vários sítios, até desembocar em outra, que conduzia à vila chamada Junqueira. Esta última estradinha, agora asfaltada, ainda lá está. Junqueira também. Igualzinha à que era, faz setenta anos.
Para ver como político é danado quando se trata de seu interesse! Quem ia sonhar com serventia diferente para a humilde estradinha? Pois a esperteza política foi capaz. Percebeu que nossa porta da sala, habitualmente fechada, podia servir de painel para cartaz de candidatos. Pela estradinha, devagar o suficiente para ver figuras e ler palavras, passava muita gente, especialmente aos sábados, indo a compras na cidade. A pé, a cavalo ou de carrinho, um veículo de tração animal que cumpria as funções do automóvel de hoje. Pregaram três cartazes em nossa porta. De candidatos a deputado, prefeito e vereador, calculo. Quiçá então se votasse em todos os cargos, de cima abaixo. A eleição não era como atualmente, a cada dois anos, embaçando a vida do país, de Brasília ao menor município de Roraima.
Os patrões haviam de cultivar lá suas ligações e definir seus candidatos. Sendo espanhol, o pai nem era eleitor. Coisas de política não lhe diziam respeito. Um daqueles cartazes, em particular, tocou meu coração infantil. Era impresso, já naquele tempo, em fino papel cuchê. Um brilhoso verde-água reproduzia o rosto de um homem esbanjando simpatia por todos os centímetros quadrados. Lembrava um tio, que eu via pouco e de quem tomava a bênção.
Nestes dias andei pensando. Pela enésima vez, estamos entrando numa campanha política. Já não existem os comícios de um tempo, com foguetório, dupla caipira e discurso caprichado. Hoje em dia, conhecemos os candidatos pela TV. Alguns, espremidos por contas de minutos e segundos. Outros, falando um ridículo “você me conhece”, o nome, o número e sumindo assustados. Tudo numa velocidade de Fórmula 1. A trabalhada cara de Photoshop do santinho ou do cartaz talvez recorde algum tio carinhoso, que nos dava a bênção. Só que já deixamos de ser crianças. Faz tempo que não acreditamos mais em coelhinho da Páscoa. Somos adultos com um título de eleitor na mão. Título de cidadão. Político tem mania de nos considerar um bando de paspalhos. Não é hora de mostrar que isso acabou? Temos agora chance de dar um basta. Afinal, não somos nós os donos da cidade?

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