terça-feira, 18 de setembro de 2012

Carlo Martini - por padre Orivaldo Robles


Dia 31 de agosto passado o mundo ficou mais pobre. Morreu Carlo Maria Martini, cardeal de Milão. Milhões de pessoas em todo o mundo acompanharam pela TV seu funeral. Mais de 200.000 mil fiéis lhe prestaram homenagem perante o caixão. Nos últimos anos, algo igual só houve no falecimento de João Paulo 2°. Era um homem brilhante. Após o doutorado, continuou estudos no Pontifício Instituto Bíblico onde, pelas qualidades de pesquisador e especialista em Sagrada Escritura, foi feito reitor. Em 1978 foi nomeado reitor da Pontifícia Universidade Gregoriana, na qual obtivera, em 1958, o doutorado em teologia. Especialista em línguas antigas, conhecia o aramaico, o acádio, o grego, o latim e o hebraico. Falava fluentemente inglês, espanhol, português, grego moderno e árabe, além do italiano, sua língua materna. Arcebispo de Milão, promoveu o diálogo entre ateus e cristãos, assim como entre as distintas religiões. Era visto como possível sucessor de João Paulo 2°.
Seu cristianismo sempre foi aberto, sofrido, dialogante. Basta lembrar o que foi a "Cátedra dos Crentes", através da qual dialogava com quem não crê, com quem está em busca, com quem é dilacerado pelas dúvidas. Mas não devemos esquecer que o cardeal emérito de Milão foi o homem da Palavra de Deus, da meditação, da oração, da Eucaristia. Seria, portanto, errado marcá-lo apenas com o clichê de bispo liberal, espécie de contraponto ao papa e à doutrina oficial.
Mais do que seus pronunciamentos e numerosos livros escritos, todos de  intensa atualidade, impressiona como enfrentou o mal de Parkinson, o mesmo que vitimou o Papa Wojtyla no final da vida. Martini, cada vez mais impedido na fala e nos movimentos, consumiu-se lentamente. Sempre fora capaz de palavras profundas e nunca banais, palavras de esperança, até mesmo para quem vivia distante da fé. Mas o sofrimento do último período tornou-o próximo e companheiro de estrada de inúmeros doentes. Seus últimos momentos foram magnífico exemplo de aceitação da vida e da sua parte mais dolorosa, que é a morte, ao rejeitar a obstinação terapêutica.
Para quem a fé embasa a vida, mas não retira a dor, conforta ler uma reflexão sobre a morte, feita pelo grande homem de Deus, mas profundo ser humano, que foi Martini:
“Mais de uma vez eu lamentei com o Senhor pelo fato de que, morrendo, não tirou de nós a necessidade de morrer. Seria tão bonito poder dizer: Jesus também enfrentou a morte em nosso lugar, e, mortos, poderemos ir para o Paraíso por um caminho florido. Ao invés, Deus quis que passássemos por esta dura viela que é a morte e que entrássemos na escuridão que sempre dá um pouco de medo. Eu me pacifiquei novamente com o pensamento de ter que morrer quando compreendi que, sem a morte, nunca chegaríamos a fazer um ato de plena confiança em Deus. De fato, em cada escolha comprometedora, nós sempre temos saídas de segurança. A morte, ao invés, nos obriga a confiar totalmente em Deus. O que nos espera depois da morte é um mistério; requer da nossa parte confiança total. Desejamos estar com Jesus, e o desejamos de olhos fechados, às cegas, colocando-nos totalmente em suas mãos. Desejamos também gozar daquela paz interior, que vence toda ansiedade e se confia a Deus de todo o coração”.
Amar a vida e ir provando lentamente a morte há de ser a dor maior. Há de ter sido a sua.

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